quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Solilóquio.

- Você tá chato.
Já não bastasse todos os problemas do mundo e ainda tinha que ouvir aquilo dela. ‘Você ta chato; mudou; ta estranho’. Estava era entediado com toda a situação,. Talvez com a vida toda. Não sei. Talvez era isso mesmo o que me incomodava. O maldito ‘não sei’.
A vontade de chorar e a raiva crônica de não conseguir martelava meu ouvido como um pêndulo sem direção. Talvez me entediei com a vida; cansei das pessoas. De toda aquela babaquice do ser ou não ser. Cansei do relógio, do calendário, dos compromissos. Aliás. Eu não tinha compromissos; eu não contava mais as horas nem os dias. Eu não tinha nada. Ninguém. Não sei porque algo me preocupava. Não sei.
- Você ta chato.
Porra, não se pode mais ser chato ? Chato é esse mundo, ou melhor, o mundo deles. Tão perto e ao mesmo tempo tão longe de mim. Eu não tenho mais mundo. Já até cansei de procurar. Perdi o rumo, quem sabe.
Vazio. Ta tudo tão vazio. O calor do sol não aquece mais o frio de meus ossos. Ou seria da alma? Frio. Só sei que faz muito frio por aqui. Nesse meu mundo-que-não-é-mundo. Quem sabe coração.
E se for para ser assim mesmo? Viver como fantasma e morrer como esquecido? Talvez é o que eu queira mesmo. Se for para ser lembrado por essa gente, que seja depois de morto então. Não há glória ter seu nome lembrado por aqueles. Pelo muro que é a sociedade. Que minha estátua afunde, para que me esqueçam assim como me esquecerei deles. Mas não terei estátua. Não serei lembrado. Tanto faz.
Perdi a vivacidade dos olhos. A jovialidade que nunca tive. Entre meus cigarros e café o mundo vivia. O mundo corria. Existia vida. Não sei se em mim também. Era uma fase egocêntrica. Eu não ligava para a vida, a não ser a minha. Irônico. Eu já não tenho mais vida.
- Você ta chato.
Estava até me conformando. Tais palavras me queimaram a pele. Secaram meus lábios. Doía. E eu não ligava para a dor. Eu não sentia a dor. Talvez eu a sentia o tempo todo, mas desconhecia sua ausência. Nesse caso, acho que dói sempre. Era dor. Quem sabe minha única amiga. Depois da solidão.
-Você ta chato. Você ta chato.
Talvez eu seja chato mesmo. Talvez eu queira ser chato, o independente. O fantasma. Talvez eu seja mesmo diferente, o qual no fim das contas, não faz nenhuma diferença. Talvez eu realmente não tenha mundo. Talvez eu seja careta. Cresci demais e antes da hora. Quem sabe sou de outros tempos, sem pai, nem mãe. Talvez nem família eu tenha.
Talvez, quem sabe, eu só queira ser eu mesmo.