sábado, 2 de agosto de 2008

Aquele, na livraria.

Entrou naquela livraria como quem não queria nada. Os cabelos desarrumados, e a barba por fazer davam-lhe um ar de mais um daqueles jovens de grandes cidades devotos ao rock n’ roll. O blazer negro sobre a camiseta branca simples fazia quase todo seu estilo, seguido por uma jeans já gasta. Um brinco numa única orelha demonstrava uma rebeldia que não combinava com os gostos do rapaz. Caminhou. Não tinha medo do tempo, naquela tarde de sexta nada parecia incomodar, só se preocupava com os livros em sua volta. Parou.

Fernando Pessoa ele buscou. Puxou um livro, folheou. Era daqueles que perdia o tempo se deliciando numa livraria numa sexta à tarde. Ouviu a porta abrir.

Entrou naquela livraria como quem não queria nada. Os cabelos lisos e educados, modelados com uma tiara; a básica maquiagem no rosto dava-lhe um ar de mais uma daquelas jovens garotas devotas a tudo que é simples e belo. A camiseta do tipo baby-look branca destacava seu corpo. A calça jeans realçava suas pernas finas, porém atraentes, terminando então com um daqueles tênis sola baixa que todo jovem usa. O rosto simples de traços delicados mostrava uma guria moleca. De olhos puxados e sorriso pequeno e desenhado, era daquelas que perdia o tempo se deliciando numa livraria numa sexta à tarde. Caminhou, procurou por poemas.

Ele, que já estava com as mãos livres, olhava por Augusto dos Anjos. Ela, passeava o indicador nos livros enfileirados, via se algo ali a interessava. Não tinham notado a presença de um do outro até o momento.

Na livraria tocava de leve uma baladinha de uma banda francesa, numa pegada meio pop-bossa nova. Foi então que tudo virou poesia.

Quando ele virou-se para a prateleira a suas costas, deu de cara com aquela jovem de um-metro-e-cinqüenta-e-pouco. Ela apresentava um ar infantil naquele momento. Encontram-se os olhares. Derreteu-se. Ele sorriu, ela respondeu abaixando a cabeça envergonhada, mas não como toda criança o faz, abaixou sua cabeça mantendo o charme, seu jogo de flerte. Ela voltou aos livros. Deu-se um momento.

- É belo.

- Como disse ?

- O livro o qual estava com as mãos sobre e não pegou. É belo.

- Então já leu ?

- Quase que toda essa sessão.

- Não me parece ser do tipo que lê.

- É como dizem, um livro vai além da capa.

- Não foi isso que falei.

E ela se virou com um sorriso, concentrada nos livros. Pegou o qual ele havia indicado, folheou. Ele sorriu mordendo os lábios, a mão direita no bolso de trás de sua calça. Levantou a cabeça como sempre faz ao ficar sem jeito, porém longe dos olhares. Suspirou.

- Eu vivo neste lugar e nunca reparei você por aqui.

- Deve ser porque nunca venho aqui.

- Um martírio.

- Diz isso pelos livros ?

- Não, pelo destino.

Mais uma vez ela sorriu, mudando de atenção. Fazia parte do seu jogo. Ele gostava.

- E gosta de ler o que?

- De tudo um pouco. Romances, prosas, contos, poesias.

- És do tipo, “jovem apaixonada” então?

- Mais ou menos. Sempre pensei que teria um amor como se tem nos livros. Já tive, terminou como se termina em um. Mas daqueles em que o amor não se termina bem.

Ficou sem o que dizer.

- Sempre há novas histórias.

- E sempre há uma a qual você nunca esquece.

- E sempre há aquela que você deixa de ler por uma capa.

Ela sorriu, olhou ele nos olhos. A sim, ele se derretia por dentro. Uma orquestra inteira estourava dentro da cabeça daquele jovem, daquelas em que se começa com os instrumentos de corda, entra os metais, e a música se entende por trovoadas da percussão com violinos. Era ecstasy em sua cabeça. Foi como ouvir Beatles pela primeira vez. Contra aquele sorriso ele nada podia.

- E quando é que pretende ler mais um romance?

- Quando me recuperar totalmente do antigo.

- E quando vai ser?

- Quando eu voltar aqui numa sexta à tarde como essa, procurando por um. Hoje fico com poesia.

- Talvez possa lhe recomendar um quando voltar.

- Já sei qual eu quero. Não vou me esquecer. Só me falta coragem para encara-lo.

- Pois até lá espero. Aí, me diz o que acha.

Ela acenou com a cabeça e se virou. Passos leves em direção ao caixa, levou um livro do Drummond. Ele, parado como uma estátua de cera. Só ouvia sua respiração. Não ia esquecer dela. Não que ele fosse alguém que não esquece rostos, não teria opção, aquilo ficou marcado, e ficaria para sempre. Ela atravessou a porta, e sumiu.

Entrou naquela livraria como quem não queria nada. Os cabelos desarrumados, e a barba por fazer davam-lhe um ar de mais um daqueles jovens de grandes cidades devotos ao rock n’ roll. O blazer negro sobre a camiseta branca simples fazia quase todo seu estilo, seguido por uma jeans já gasta. Um brinco numa única orelha demonstrava uma rebeldia que não combinava com os gostos do rapaz. Caminhou. Não tinha medo do tempo, naquela tarde de sexta nada parecia incomodar, a não ser a vontade de encontrar aquela novamente, e então, não querer mais saber de ler. Ouviu a porta abrir e sorriu.

Um comentário:

e para Maitê disse...

- Você me inspirou a contar uma breve história que dura até hoje.
Obrigada!

Achei incrível, parece até uma linda história de um quase amor.

O primeiro conto, a gente nunca esquece!!
rs